Editorial - Estadão
O crônico déficit de vagas nos 1,4 mil estabelecimentos penais brasileiros tem sido objeto de planos destinados a reduzir a superlotação das penitenciárias. Com um orçamento de R$ 1,2 bilhão, o último foi lançado no final de 2011 pela presidente Dilma Rousseff. Intitulado Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional, ele previa a criação de 42,5 mil novas vagas nas penitenciárias e a redução do número de presos em delegacias de polícia. O Plano também oferecia um banco de projetos arquitetônicos a serem adotados como modelos pelos Estados. Autorizava ainda a constituição de grupos de trabalho para estimular a aplicação de penas alternativas e a instituição de um sistema de acompanhamento da execução das penas, medidas de segurança e prisão provisória. E, sob a justificativa de que o País não podia mais tolerar a violação da dignidade humana, prometia assistência integral aos presos. “Não podemos mais conviver com cadeias e presídios que são verdadeiras escolas de criminalidade, com infrações aos direitos humanos. Não podemos mais tolerar situações como essas, em que pessoas são tratadas como animais”, disse, na época, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
Seis anos depois, o saldo do Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional é pífio. Das 42,5 mil vagas prometidas, somente 2,8% foram entregues. Das 92 obras financiadas pelo governo federal, 34 estão paradas, 40 não têm nem 10% do serviço executado e 9 não saíram da estaca zero. Nas restantes, a única providência foi a delimitação das respectivas áreas. Em 2015, o Ministério da Justiça já estimava que, no melhor dos cenários, conseguiria entregar apenas 1,5 mil vagas naquele ano e outras tantas em 2016.
Entre os convênios com os governos estaduais, dois foram firmados para a expansão do sistema prisional do Rio Grande do Norte e do Amazonas, em cujos estabelecimentos penais as rebeliões dos últimos dias resultaram em 90 presos decapitados e carbonizados. Nos dois Estados, as obras financiadas pelo Plano estão bastante atrasadas, tendo sido executados 35,8% das do Rio Grande do Norte e 75,9% das do Amazonas. Em Roraima, como informa o jornal [ITALIC]O Globo,[/ITALIC] os convênios tiveram de ser suspensos por falta de prestação de contas entre os anos de 2012 e 2013. Depois de esse problema ter sido sanado, as obras voltaram a ser suspensas, por falhas na parte elétrica e hidráulica dos projetos. Em seguida, o governo de Roraima teve de abrir nova licitação para retomar as obras.
As razões do fracasso do Plano Nacional de Apoio ao Sistema Prisional são conhecidas há muito tempo. Elas envolvem resistência das prefeituras à criação de presídios em sua jurisdição, dificuldades jurídicas na desapropriação de áreas para a construção de penitenciárias, documentação irregular, cancelamento de licitações, desistência de empresas, inépcia administrativa dos governos estaduais, morosidade do agente financeiro encarregado do pagamento das empreiteiras e falhas da própria concepção do Plano, que, por ter sido feito às pressas, incorporou contratos de construção firmados no segundo mandato do presidente Lula para a criação de presídios destinados a jovens e adultos. Um desses contratos, assinado em 2007, previa a construção de uma cadeia pública em Gericinó, zona oeste do Rio de Janeiro. Até 2015, nada havia sido erguido no local. A implementação do Plano também foi afetada por atrasos na liberação de recursos, pois entre 2013 e 2014 o governo federal desviou 34% das verbas destinadas à expansão do sistema prisional para construir estádios para a Copa do Mundo.
O colapso do sistema carcerário, evidenciado pela trágica onda de sangrentos motins, é o resultado da inépcia dos governantes, que são pródigos em lançar planos inconsistentes e despreparados para gerir a máquina pública e cumprir promessas.
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