O sr. já disse que há um “assanhamento juvenil” na discussão do foro privilegiado. O debate está equivocado?
É necessário o debate para se encontrar uma justa conformação. Quando
se fala que “o grande problema do Brasil é o foro privilegiado”, é
irresponsabilidade. Porque a Justiça criminal do Brasil tem um grande
defeito: só 8% dos homicídios são desvendados no Brasil. Os processos
não andam em várias instâncias. As pessoas só são investigadas quando
passam a ter foro privilegiado. Quando estavam nos seus Estados, não
eram investigadas ou as investigações não davam resultado. É uma grande
irresponsabilidade apresentar a supressão do foro como panaceia. Não que
o sistema não precise ser aperfeiçoado.
A quem caberia fazer esse aperfeiçoamento?
Ao Congresso, com uma proposta de emenda constitucional.
Parlamentares ameaçam retirar o foro
privilegiado de magistrados e integrantes do Ministério Público caso o
STF restrinja o foro de políticos. É retaliação?
É uma forma de diálogo. Agora, eles têm razão: se se quer acabar com o
foro, é para todos. Os juízes respondem perante tribunais,
desembargadores respondem perante o STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Falam de 22 mil autoridades, ora bolas, são 17 mil juízes, quantos
membros de Ministério Público? Começa por aí. Por outro lado, a ideia do
foro não é para proteger a pessoa, é para proteger a instituição.
A julgar por suas críticas, o Supremo Tribunal
Federal está se metendo demais nos outros Poderes e até dando a
impressão de que está governando o País?
Se
quiser governar, tem de discutir isso com a população, porque não é essa
a função do Supremo. Decisões erráticas certamente não traduzem um bom
governo. Em questões delicadas, na relação de Poderes, deve imperar a
colegialidade. O pior que pode acontecer para um tribunal como este é
não ser reconhecido como o árbitro desses conflitos.
E o Supremo foi questionado em vários momentos.
Exatamente. Quando em função de decisões singulares, para não dizer
exóticas, se legitima do outro lado o não cumprimento ou o delay na
aplicação de uma decisão, a gente tem de ficar cauteloso.
A imagem do STF ficou arranhada no ano passado?
Vamos dizer que não ficou lustrosa.
O senhor é amigo do presidente Michel Temer.
Como vê essa relação de proximidade diante do julgamento da ação no TSE
que pode levar à cassação do mandato dele?
No caso da chapa Dilma-Temer, fui eu inicialmente a única voz que se levantou para a abertura do processo. A relatora (a ex-ministra Maria Thereza de Assis)
defendeu o arquivamento. Se esse processo existe até hoje, sem querer
ser falsamente modesto, foi graças a mim. As coisas não se misturam.
A inclusão da delação da Odebrecht vai transformá-lo no “processo do fim do mundo”?
Não se transforma em processo do fim do mundo, mas pode atrasar. E pode
ter a própria utilidade discutida. As pessoas fixam em relação a esse
processo a ideia de um resultado almejado. “Só haverá julgamento se
houver condenação.” Não é assim. Tribunal que só condena é tribunal
nazista. Não se pode medir um tribunal pelo critério do número de
condenação.
O sr. defende mudanças na escolha de ministros do STF?
A gente tem de ter responsabilidade nas propostas de mudança, e você
tem de medir as instituições pelos resultados. Vocês estão contentes com
os resultados, por exemplo, do TCU (Tribunal de Contas da União),
para onde o Legislativo tem duas indicações? Será que a OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil) tem mandado os melhores nomes para o STJ e para o
TST (Tribunal Superior do Trabalho)? O Supremo está melhor composto do que outros tribunais. Não se conseguiu indicar um sindicalista para cá.
A Associação dos Magistrados Brasileiros sugeriu que o próprio STF elaborasse uma lista.
Seria um modelo de cooptação. É preciso que haja uma legitimação
política, não que o sujeito seja vinculado partidariamente, mas que seja
reconhecido pelo mundo político. Pensar em fórmulas abertas, de novo,
são os reformadores da natureza, um pouco de “calcem as sandálias da
humildade”.