segunda-feira, 13 de março de 2017

Atoleiros esvaziam BR-163 e encarecem escoamento

Após servir almoço aos últimos 3 dos 12 clientes de seu restaurante em Santa Luzia, interior do Pará, Seloi Primo, 55 anos, recosta-se numa cadeira de balanço na varanda.

É tarde de quinta-feira (9). A comerciante olha para a silenciosa paisagem à sua frente, onde há soldados do Exército de sentinela sob uma barraca montada à frente da rodovia BR-163, que liga o Mato Grosso ao Pará.

Eles estão ali para controlar a circulação de caminhoneiros que levam soja para a exportação. Por 20 minutos, nenhum veículo passa.

Uma semana antes, no mesmo ponto começava uma fila de quase 50 quilômetros. A Folha percorreu o local na semana passada.

"Isso aqui virou um inferno. Era pra mais de cem pessoas aqui a essa hora", diz Seloi, gaúcha que migrou há 26 anos para a região.

A estimativa das autoridades é que quase 5.000 caminhoneiros tenham ficado parados, alguns por até 20 dias, por causa de atoleiros num trecho de 37 quilômetros dessa rodovia, que tem mil quilômetros só no Pará. Algumas cidades ficaram sem comida e água no período.

Até então, em média 600 caminhões saíam por dia do Mato Grosso em direção a Miritituba, distrito de Itaituba (PA), onde cinco terminais portuários são usados para escoar a soja via barcaças pelo Rio Tapajós, até Santarém (PA), de onde segue de navio para outros países.

Ao custo de até R$ 1,5 bilhão cada, os terminais privados iniciados nessa década já ficaram prontos.

Mas a rodovia pública, cujo projeto de asfaltamento começou antes do ano 2000, ainda tem pelo menos 189 quilômetros não asfaltados, quase 100 quilômetros deles até Miritituba. Ela vai custar mais de R$ 2 bilhões.

Segundo Edeon Vaz, do Movimento Pró-Logistica do Mato Grosso, a capacidade dos terminais em Miritituba é de 16 milhões de toneladas por ano, cerca de 30% das exportações brasileiras.

Mas transportadores não querem mais ir para lá. "O pessoal assustou", diz Cosmo Barbosa dos Santos, 38, que perdeu 20 dias na rodovia.

O número de veículos na semana passada era menos de um quinto do que chegava até o início dos atoleiros. Pátios para abrigar mil caminhões estavam vazios.

Os poucos que se arriscam contam que, mesmo com os problemas, a rota Mato Grosso-Pará é a única que ainda dá para ganhar dinheiro.

Cada caminhão bitrem transporta quase 50 toneladas de soja, recebendo entre R$ 170 e R$ 200 por tonelada do produto, a depender do local onde a carga é coletada.

Até os terminais de Miritituba ficarem prontos, a principal opção era descer para Santos (SP) ou Paranaguá (PR). Para essas cidades, o frete fica em torno de R$ 300 por tonelada, mas com 2,8 mil quilômetros de estrada.

"Aí você gasta mais diesel, pneu, freio. E pedágio", diz o caminhoneiro Marcelo Ferreira que estima em R$ 1 mil somente as tarifas.

Se os cerca de 500 caminhoneiros que seguiam por dia para o Pará forem para o sul, o custo para levar a soja até esses portos fica R$ 2,5 milhões por dia mais caro em comparação com Miritituba.
GRÃOS AOS TRANCOS E BARRANCOS
Rodovia que transporta grande parte da soja brasileira sofre com problemas
O QUE É
Rodovia vai do Rio Grande do Sul ao Pará, com mais de 3.500 km
IMPORTÂNCIA
Considerada hoje a Rota da Soja por ser o caminho por onde é escoada a maior parte dos grãos que seguem para exportação
O PROBLEMA
Apesar de o asfaltamento no Centro-Oeste ter começado há mais de 15 anos, ainda há trechos não concluídos
POR QUE PIOROU
Até 2016, a rota era preferencialmente do Centro-Oeste para o Sul e Sudeste, de onde o produto era escoado pelos portos de Paranaguá (PR) e Santos (SP)
rota da soja
rota da soja
1) EXTENSÃO APROXIMADA: 30 km
Asfaltado, mas com buracos na pista. Há duas pontes que ainda são de madeira e que suportam até de 24 toneladas, metade do peso da soja nos caminhões bitrem
2) EXTENSÃO APROXIMADA: 50 km
Asfaltado, mas com buracos causados pela falta de sistema de drenagem adequado. Há trechos de até 50 metros com asfalto destruído
3) EXTENSÃO APROXIMADA: 58 km
Asfaltado, com pavimento de boa qualidade e praticamente sem buracos. Um trecho de 10 km próximo à sede de Bela Vista do Caracol está terraplanado mas não asfaltado, embora em boas condições de tráfego
4) EXTENSÃO APROXIMADA: 37 km
Trecho sem asfalto e sem terraplanagem. É onde ocorrem os atoleiros que fecharam a estrada por praticamente duas semanas. Mesmo com conservação, área ainda é de tráfego lento, interrompido quando há chuva forte
5) EXTENSÃO APROXIMADA: 220 km
Asfaltado, mas com duas áreas, uma de 47 km já próxima à sede que foi terraplanada, mas não asfaltada (Trecho não percorrido pela reportagem, informação dos usuários)
(Fonte: Folha de SP)

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