Editorial - Estadão
Por 6 votos a 3, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência do Senado, impedindo-o, no entanto, de assumir a Presidência da República em caso de substituição ou vacância. Ao decidir desta forma, a Corte acolheu apenas parcialmente a liminar dada pelo ministro Marco Aurélio Mello na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) interposta pela Rede Sustentabilidade. A decisão monocrática tomada por Marco Aurélio colocou o STF em uma enrascada. Sua liminar atabalhoada – para dizer o mínimo – obrigou o colegiado a decidir por um entre dois caminhos igualmente desgastantes para a instituição máxima do Poder Judiciário. A decisão mais fácil, sob o estrito ponto de vista da Corte, seria o plenário referendar na íntegra a esdrúxula liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio na segunda-feira passada e manter a destituição de Renan Calheiros da presidência do Senado. Caso assim decidisse, o Supremo satisfaria grande parte da opinião pública – “Fora, Renan” foi um dos principais motes das manifestações ocorridas no último domingo –, tornaria a Corte popular ante o imbróglio institucional em que o País foi metido e ainda evitaria a construção da imagem de um tribunal fraco e desmoralizado, uma Suprema Corte que se ajoelha diante da petulância de um autocrata. Mas isso significaria corroborar um absurdo.
A gravíssima crise econômica, política e institucional por que passa o Brasil exige serenidade das pessoas investidas do poder de orientar os rumos da Nação. A serenidade necessária para os impelir a pôr veleidades particulares muito abaixo do interesse nacional. O discernimento para enxergar que o caminho mais fácil nem sempre é o melhor para o bem comum é uma das grandes virtudes exigidas daqueles alçados a posições de liderança na esfera pública. Felizmente, prevaleceu no plenário do STF o sentimento de que o País não suporta mais as consequências do acirramento de ânimos das mais altas autoridades da República. A maioria da Corte teve a coragem de adotar uma decisão que não será bem compreendida por muitos, mas que é a correta, do ponto de vista jurídico, e a adequada, do ponto de vista político.
A decisão mostrou que as articulações havidas entre os membros da Corte, capitaneadas pela presidente Cármen Lúcia, caminharam na direção do armistício entre os Poderes, ao menos por ora, e privilegiaram o interesse público ao garantir o bom seguimento de medidas absolutamente necessárias para o equilíbrio fiscal e retomada do crescimento econômico. O aumento da confiança das empresas, a geração de empregos e a consequente melhoria da qualidade de vida da população dependiam disso.
Ao contrário da percepção corrente, o STF não se apequenou com a decisão tomada por seus membros. Na verdade, o colegiado consertou uma enorme lambança perpetrada pelo ministro Marco Aurélio, cuja decisão – acaso fosse referendada integralmente – poderia expor o País a consequências ainda mais penosas pelo aprofundamento do quadro de incertezas. Como asseverado pelo ministro Luiz Fux durante a sessão de julgamento, a natureza do real perigo de lesão grave alegado pela Rede Sustentabilidade em seu pedido inicial reside, na verdade, no fato de se destituir o presidente do Senado no momento mesmo em que tramitam na Câmara Alta medidas de altíssima importância, cujo andamento poderia ser travado ao se transferir o controle da pauta legislativa da Casa ao senador Jorge Viana (PT-AC), cujo partido é frontalmente contra a adoção dessas medidas.
É importante frisar, como já dito neste mesmo espaço, que um político da estirpe de Renan Calheiros não deveria sequer ter sido eleito senador da República, menos ainda alçado à presidência da Câmara Alta. Mas uma vez escolhido pelo povo alagoano para representar seu Estado e eleito por seus pares para ocupar o cargo que ocupa, há que se observar com rigor as formalidades exigidas pela lei. O Supremo Tribunal Federal mostrou altivez ao admitir que um de seus ministros pode errar. Reconhecer um erro e repará-lo jamais pode significar desmoralização. Desmoralização seria o plenário manter uma decisão manifestamente equivocada apenas movido pela ideia de infalibilidade que a Corte Suprema não tem.
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