Por Eliane Cantanhêde - Estadão
Quem prestar atenção às falas do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero e do presidente Michel Temer, sem radicalismo e sem ideias preconcebidas, faz uma constatação interessante: os dois estão dizendo a mesma coisa, fazendo o mesmo relato sobre as três conversas que tiveram na semana do pedido de demissão de Calero. A confusão toda está em como cada um deles sentiu e interpretou essas conversas.
Temer, em entrevistas e diálogos com interlocutores, e Calero, em entrevistas e no depoimento à PF, contam que se encontraram num jantar no Alvorada na quarta-feira, voltaram a se falar no dia seguinte e, por fim, trocaram palavras protocolares por telefone, na sexta, quando o ministro já tinha articulado a primeira entrevista bombástica sobre o apartamento de Geddel Vieira Lima e o depoimento oficial à PF no Rio (antes mesmo de se demitir oficialmente).
Na primeira conversa, Calero concluiu que Temer ficou do seu lado na disputa e resolveria o problema com o secretário de Governo, mas Temer dá a entender que a conversa foi superficial, no clima do jantar, e que agiu como se tratasse de mais uma dessas briguinhas entre ministros e colegas que acontecem toda hora e aporrinham a rotina de presidentes e chefes.
Os dois contam a mesma história sobre a segunda conversa, quando Temer decidiu pedir a Calero para enviar a questão para a Advocacia-Geral da União (AGU). Só que... Calero sentiu e interpretou isso como uma forma de “enquadrá-lo” e de envolvê-lo numa “chicana”. E Temer fala como se estivesse lavando as mãos numa disputa menor entre ministros. Ele justifica que cabe à AGU desempatar querelas entre entes da administração e resume o caso a uma divergência entre Iphan nacional e Iphan da Bahia. E no telefonema final, rapidíssimo, os dois só selaram a demissão e pronto. Se Calero só gravou essa conversa com Temer, melhor para Temer...
Calero, de 34 anos, estreante no primeiro escalão, adota um certo tom épico-humilde e comporta-se como um herói desses tempos de depuração de práticas políticas. Temer, de 75, três vezes presidente da Câmara, assume um ar ora de perplexidade, ora de indignação, com a acusação de que tentou “enquadrar” o ministro ou favorecer um apartamento em Salvador no qual não tem o mínimo interesse. Conflito geracional? Sinal de que as coisas estão mudando? E, afinal, Calero foi “influenciado por amigos do Rio”, como imagina Temer, ou “orientado por amigos da PF”, como ele mesmo diz?
O fato é que Geddel – que sempre parece esbaforido, como brinca o presidente – acabou sendo o pivô da maior crise dos seis meses do governo Temer, e não foi por causa da economia, da política, da Lava Jato ou da Odebrecht, mas por causa de uma carteirada de primeiro escalão e de um apartamento no lugar errado, na hora errada.
Convenhamos: um apartamento, por maior e mais caro que seja, não deveria deixar um articulador político de governo, qualquer governo, tão excitado assim, a ponto de mexer mundos e fundos e acionar ministros e até o presidente da República. E, do outro lado, convenhamos: um apartamento, por mais mal localizado que seja, não deveria abalar a República, especialmente num momento de crise econômica e de escândalos na faixa de bilhões de reais.
A política, no entanto, tem sua dinâmica, suas motivações e manhas, e o apartamento de Geddel não só jogou a crise no colo de Temer e amplificou as várias irritações brasileiras como elevou perigosamente o grau de incerteza. Daí por que Temer foi compelido à coletiva entre Renan e Rodrigo Maia e o PSOL entrou com o pedido de impeachment ao qual Hélio Bicudo parece já aderir. O impeachment é altamente improvável, mas esses gestos mostram como os tempos estão bicudos.
Quem prestar atenção às falas do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero e do presidente Michel Temer, sem radicalismo e sem ideias preconcebidas, faz uma constatação interessante: os dois estão dizendo a mesma coisa, fazendo o mesmo relato sobre as três conversas que tiveram na semana do pedido de demissão de Calero. A confusão toda está em como cada um deles sentiu e interpretou essas conversas.
Temer, em entrevistas e diálogos com interlocutores, e Calero, em entrevistas e no depoimento à PF, contam que se encontraram num jantar no Alvorada na quarta-feira, voltaram a se falar no dia seguinte e, por fim, trocaram palavras protocolares por telefone, na sexta, quando o ministro já tinha articulado a primeira entrevista bombástica sobre o apartamento de Geddel Vieira Lima e o depoimento oficial à PF no Rio (antes mesmo de se demitir oficialmente).
Na primeira conversa, Calero concluiu que Temer ficou do seu lado na disputa e resolveria o problema com o secretário de Governo, mas Temer dá a entender que a conversa foi superficial, no clima do jantar, e que agiu como se tratasse de mais uma dessas briguinhas entre ministros e colegas que acontecem toda hora e aporrinham a rotina de presidentes e chefes.
Os dois contam a mesma história sobre a segunda conversa, quando Temer decidiu pedir a Calero para enviar a questão para a Advocacia-Geral da União (AGU). Só que... Calero sentiu e interpretou isso como uma forma de “enquadrá-lo” e de envolvê-lo numa “chicana”. E Temer fala como se estivesse lavando as mãos numa disputa menor entre ministros. Ele justifica que cabe à AGU desempatar querelas entre entes da administração e resume o caso a uma divergência entre Iphan nacional e Iphan da Bahia. E no telefonema final, rapidíssimo, os dois só selaram a demissão e pronto. Se Calero só gravou essa conversa com Temer, melhor para Temer...
Calero, de 34 anos, estreante no primeiro escalão, adota um certo tom épico-humilde e comporta-se como um herói desses tempos de depuração de práticas políticas. Temer, de 75, três vezes presidente da Câmara, assume um ar ora de perplexidade, ora de indignação, com a acusação de que tentou “enquadrar” o ministro ou favorecer um apartamento em Salvador no qual não tem o mínimo interesse. Conflito geracional? Sinal de que as coisas estão mudando? E, afinal, Calero foi “influenciado por amigos do Rio”, como imagina Temer, ou “orientado por amigos da PF”, como ele mesmo diz?
O fato é que Geddel – que sempre parece esbaforido, como brinca o presidente – acabou sendo o pivô da maior crise dos seis meses do governo Temer, e não foi por causa da economia, da política, da Lava Jato ou da Odebrecht, mas por causa de uma carteirada de primeiro escalão e de um apartamento no lugar errado, na hora errada.
Convenhamos: um apartamento, por maior e mais caro que seja, não deveria deixar um articulador político de governo, qualquer governo, tão excitado assim, a ponto de mexer mundos e fundos e acionar ministros e até o presidente da República. E, do outro lado, convenhamos: um apartamento, por mais mal localizado que seja, não deveria abalar a República, especialmente num momento de crise econômica e de escândalos na faixa de bilhões de reais.
A política, no entanto, tem sua dinâmica, suas motivações e manhas, e o apartamento de Geddel não só jogou a crise no colo de Temer e amplificou as várias irritações brasileiras como elevou perigosamente o grau de incerteza. Daí por que Temer foi compelido à coletiva entre Renan e Rodrigo Maia e o PSOL entrou com o pedido de impeachment ao qual Hélio Bicudo parece já aderir. O impeachment é altamente improvável, mas esses gestos mostram como os tempos estão bicudos.
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