segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Adolescência

Por Carolina Delboni - Estadão
Parece que dá pânico só de ouvir a palavra. A gente fica meio sem saber o que fazer. Até esquece que um dia já foi adolescente. Aliás, essa é a parte mais importante desse texto porque se a cada reação do filho/filha lembrássemos que um dia fomos iguais, tudo seria mais brando e tranquilo. No fundo, não é uma fase monstra. É uma fase de mudanças e de ambos os lados. De lá é a saída da infância, e de cá precisa mudar a chavinha e dialogar com o filho. Não vale mais dar ordens e esperar obediência. Adolescente precisa de escuta, porque precisa ser compreendido e se sentir compreendido. E quando ele não tem escuta dentro de casa, vai procurar em outro lugar.

Alias, tá aí a segunda parte mais importante deste texto: a procura. Tudo (eu disse tudo mesmo) que um adolescente precisa e não for oferecido a ele de forma saudável, ele vai buscar uma forma qualquer de experimentação. Vou explicar. Em palestra recente à pais de alunos de 6a, a psicóloga Sandra Stirbulov, autora do livro A Arte de Educar em Família, enfatizou a necessidade do adolescente de experimentação. Mais adrenalizada, mais radical, mais desafiadora. “O adolescente busca sensações físicas e emocionais que gerem adrenalina”. Por tanto, precisamos proporcionar adrenalinas boas para que possam viver as sensações de forma positivas e não negativas. Na prática, isso significa viagens mais radicais ou de aventura, esportes e competições. “Eles gostam de serem desafiados e precisam desses desafios para provarem sua autoestima e segurança social”, explica Sandra. O mesmo vale para o campo emocional. Eles precisam viver fortes emoções. Precisam sentir o coração disparar. E que seja de amor! Por favor. Nada de brincadeiras estupidas como perder o ar, parar de respirar e correr o risco de morrer. Pois é, esse é um exemplo claro de adrenalina no jovem. Pais precisam preencher esse espaço e essa necessidade para que não seja preenchido com besteiras irracionais típicas da idade. Ídolos. Adolescentes precisam de ídolos. Aqui vale o resgate na sua linha do tempo para lembrar quem eram seus ídolos. Quem você admirava, tinha vontade de ser. Eles precisam desse alguém pra olhar, mirar e dizer “quero ser essa pessoa quando eu crescer”. Precisam dessa referencia humana. Hora de começar a ler biografias de pessoas bacanas, sejam músicos, ativistas, inventores, cientistas. Quem for. Só não vale conto de fadas. As historias não devem mais ter final feliz. Pode ter muito percalço pelo caminho. É saudável e é verdadeiro. Adolescentes precisam de referencias verdadeiras. Já não são mais crianças. Sem contar histórias das histórias agora.

Os traços da infância são passados. Precisamos colocar novos rituais. Até a oração precisa mudar. Não pode mais ser a oração de criancinha. Querem ser tratadas com respeito, como alguém que está crescendo. Aqui começam a adquirir coisas que os mais velhos podem fazer, como ver um pouco mais de tv, ver o programa que o irmão não pode, ir na padaria sozinho, ir de bike até a casa do amigo. Precisam ganhar autonomia física e emocional. De novo: se não ensinarmos o caminho das pedras, eles vão aprender sozinho. E autonomia só se conquista com liberdade dirigida. Soltar no mundo com pequenas responsabilidades pra que ele se sinta mais “eu”. Sair desenfreado pela vida gera acidente. Deveríamos saber bem disso. Melhor esquecer o medo do perigo lá fora e começar a ensinar teu filho a andar por aí com o mínimo de autonomia. Porque achar que dentro de casa, com o celular e a tv ele esta protegida é um grande engano! “A gente não dá liberdade física, mas da liberdade virtual e que tem os mesmos perigos que a rua. Que valores eles acessam com essa suposta troca de segurança? “, questiona Sandra. Pois é.…que falsa liberdade é essa? Perigo que a gente não vê e desconhece ainda.

Porque dos 12 aos 21, eu ensino a fazer opções pra que ele aprenda a colocar sua opinião socialmente e fazer suas próprias conquistas. Importante pra autoestima. “Adolescência é a fase da percepção. Antes eles imitavam os adultos. Agora eles observam comportamento e atitude e fazem suas avaliações. É preciso ter muita coerência porque nesta fase se forma o caráter”, explica. Do mundo de valores e comportamento é que se prepara o caráter. Forte. Importante. E preenchido de responsabilidade. Na primeira infância, a criança desenvolve os valores morais, depois vem a ética e agora o caráter. E é a somatória da moral, ética e do caráter que a gente constrói personalidade numa pessoa. E tudo vai depender com o que adubamos e com que frequência regamos. Analogia para o que eu escrevi lá no 2o paragrafo quando eu dizia de proporcionarmos adrenalinas saudáveis a eles. Este é o adubo. Adubo que vem de pai e mãe, vem do educador da criança, de quem cuida. O proporcionar essas experiências deve estar muito mais em nossas mãos do que na deles. Adolescentes precisam de direção. Precisam aprender a usar o fogo que carregam. Pra não se queimarem e não queimarem ninguém. Pra isso, precisamos abrir o dialogo. “A gente vem no vício de não ouvir porque quando o filho era criança, só comandávamos. Tem que aprender a ouvir e a valorizar, isso não quer dizer acatar com tudo”, pontua a psicóloga. Eles precisam de escuta. Escuta verdadeira. Não é pra interromper e falar “já sei o que você vai falar”. Mesmo que saiba, deixe eles irem até o final. Ouvir é estar presente. E quer coisa melhor que presença nessa vida?

“Nem tudo é fácil” diz o poema da Cecilia Meireles. Mas estamos aqui pra ensinar e não podar. Podamos para dar direção, pra crescer forte e saudável. Não para punir os movimentos ou frear a liberdade. Os movimentos na adolescência são lindos. São libertadores de pai e mãe. São a mais pura descoberta de quem sou. Mesmo que ainda ingênuo e imaturo. É o começo de uma longa vida pela frente. Precisamos fazer parte dessa parte da história. Continuar construindo o álbum de fotos.

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