O Supremo Tribunal Federal consagrou, ontem (5/10), que o Judiciário
pode mandar prender réus antes mesmo de esperar o trânsito em julgado da
condenação. O Plenário da corte definiu que, embora a Constituição
Federal diga que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória”, um condenado já pode ser preso
depois de decisão de segunda instância.
O placar terminou em 7 a 4. Embora o ministro Dias Toffoli tenha mudado de posição para dizer que as penas só podem ser executadas depois de decisão do Superior Tribunal de Justiça, concordou com a maioria ao reconhecer que é desnecessário esperar o trânsito em julgado. A decisão é cautelar, pois o mérito ainda não foi julgado.
Último a votar antes da presidente do tribunal, o ministro Celso de Mello criticou o entendimento dominante. Disse que o resultado do julgamento era uma “preocupante inflexão hermenêutica de índole regressista no plano sensível dos direitos individuais, retardando o avanço de uma significativa agenda judiciaria concretizadora dos direitos fundamentais”.
A discussão chegou ao Supremo em duas ações declaratórias de constitucionalidade sobre o artigo 283 do Código de Processo Penal. O dispositivo diz que o réu só pode ser preso depois do trânsito em julgado da condenação, a não ser que haja o decreto de prisão cautelar ou em flagrante.
As ações são de autoria do Partido Ecológico Nacional (PEN) e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Ambos ajuizaram as ADCs para tentar reverter o entendimento adotado pelo Supremo em fevereiro, quando o Plenário julgou um Habeas Corpus com tema semelhante, por 7 votos a 4.
Celso ficou vencido em fevereiro e também nesta quarta, acompanhando o relator, ministro Marco Aurélio, e os ministros Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Nas ADCs, Marco Aurélio já havia votado no dia 1º de setembro, quando o julgamento teve início. Naquela ocasião, fez um duro pronunciamento sobre a postura dos colegas diante do caso.
Emenda judiciária
Para o vice-decano, o inciso LVII do artigo 5º da Constituição “não abre campo a controvérsias semânticas”. Na opinião do ministro, quando autorizou a “execução provisória”, o Supremo editou uma “emenda constitucional ilegítima”. “O abandono do sentido unívoco do texto constitucional gera perplexidades", disse Marco Aurélio.
No dia 1º, o julgamento foi interrompido com o fim da sessão e foi retomado nesta quarta, com os votos dos ministros Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. E ambos mantiveram seus entendimentos de fevereiro, de que aguardar o trânsito em julgado contribui com a morosidade do Judiciário e com a falta de efetividade do sistema penal.
A ministra Rosa Weber, também vencida, concordou com Marco Aurélio. Ela elogiou os colegas que venceram e todos os argumentos, dizendo até concordar com muitos deles. Mas disse que “a interpretação está atrelada às possibilidades semânticas das palavras”.
“Se a Constituição, com clareza, em seu texto vincula o princípio da presunção de inocência a uma condenação transitada em julgado, não vejo como possa chegar-se a uma interpretação diversa.”
Direitos fundamentais
Em fevereiro, ficou vencido o voto do ministro Teori Zavascki, relator do Habeas Corpus em pauta. Segundo ele, a segunda instância encerra a etapa de discussão de fatos e provas de autoria e materialidade. Ao STJ e ao Supremo cabem discussões de direitos e garantias e os recursos a eles não têm efeito suspensivo.
Por isso, a execução da pena antes de pronunciamento das cortes de Brasília não violaria o princípio da presunção de inocência. O ministro Luiz Fux, depois, completou. Disse que ao discutir os direitos fundamentais do acusado, “estamos esquecendo do direito fundamental da sociedade”.
Meio termo
O único que mudou seu posicionamento em relação a fevereiro foi Dias Toffoli. No Habeas Corpus, ele havia acompanhado o ministro Teori. Nesta quarta, atendeu ao pedido intermediário dos signatários da ação de autoria do PEN, para que as penas só possam ser executadas depois de decisão do STJ.
No entendimento de Toffoli, os recursos ao Supremo e ao STJ têm natureza diferente. No primeiro caso, explicou, a instância é extraordinária e pressupõe a presença de questão constitucional em debate e que o processo trata de tema de repercussão geral política, jurídica, social, cultural ou econômica maior que os interesses das partes em litígio. Essas são condições de admissibilidade dos recursos extraordinários pelo STF.
Portanto, concluiu o ministro, assim que é admitido, o recurso ao Supremo deixa de ser subjetivo e passa a discutir questões constitucionais e teses em abstrato.
Já o STJ discute questões subjetivas, que podem influenciar apenas na situação do réu, disse Toffoli. Isso porque a função do tribunal é, além de uniformizar a interpretação da lei, também uniformizar sua aplicação em casos concretos.
Por isso, o recurso especial, cabível ao STJ, “também se presta a corrigir ilegalidades de cunho individual”. “Nem se argumente que aguardar o julgamento do recurso especial custaria a efetividade do processo penal, uma vez que essa efetividade não pode custar direitos fundamentais”, concluiu Toffoli.
Remédio
O ministro Gilmar Mendes também acompanhou a divergência, para dizer que o réu pode ser preso independentemente do trânsito em julgado. Segundo o ministro, em geral, os casos de erros da segunda instância ou decisões teratológicas não chegam ao Supremo por meio de recurso.
De acordo com Gilmar, é o Ministério Público que apresenta os recursos especial e extraordinários, já que não tem outro jeito de chegar ao STJ e ao Supremo. Para os réus, disse, “sempre haverá o Habeas Corpus”.
Foi interrompido pelo ministro Marco Aurélio, que disse que, no que depender da 1ª Turma, nem sempre o réu terá o HC. É que o colegiado tem o entendimento de que o Habeas Corpus não pode ser usado para saltar instância e nem deve ser conhecido se não tratar de violações diretas a liberdade.
A 2ª Turma, da qual Gilmar faz parte, nunca adotou esse entendimento, inaugurado pelo próprio ministro Marco Aurélio. Para Gilmar Mendes, embora o princípio da presunção de inocência seja “relevantíssimo”, pode ser relativizado.
“Por isso, não há de se considerar a prisão de segundo grau haja de ser violadora da presunção de inocência”, concluiu. “Evidentemente poderá haver sim situações de abuso, que reparamos com o HC, nem discutimos isso.”
O placar terminou em 7 a 4. Embora o ministro Dias Toffoli tenha mudado de posição para dizer que as penas só podem ser executadas depois de decisão do Superior Tribunal de Justiça, concordou com a maioria ao reconhecer que é desnecessário esperar o trânsito em julgado. A decisão é cautelar, pois o mérito ainda não foi julgado.
Último a votar antes da presidente do tribunal, o ministro Celso de Mello criticou o entendimento dominante. Disse que o resultado do julgamento era uma “preocupante inflexão hermenêutica de índole regressista no plano sensível dos direitos individuais, retardando o avanço de uma significativa agenda judiciaria concretizadora dos direitos fundamentais”.
A discussão chegou ao Supremo em duas ações declaratórias de constitucionalidade sobre o artigo 283 do Código de Processo Penal. O dispositivo diz que o réu só pode ser preso depois do trânsito em julgado da condenação, a não ser que haja o decreto de prisão cautelar ou em flagrante.
As ações são de autoria do Partido Ecológico Nacional (PEN) e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Ambos ajuizaram as ADCs para tentar reverter o entendimento adotado pelo Supremo em fevereiro, quando o Plenário julgou um Habeas Corpus com tema semelhante, por 7 votos a 4.
Celso ficou vencido em fevereiro e também nesta quarta, acompanhando o relator, ministro Marco Aurélio, e os ministros Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Nas ADCs, Marco Aurélio já havia votado no dia 1º de setembro, quando o julgamento teve início. Naquela ocasião, fez um duro pronunciamento sobre a postura dos colegas diante do caso.
Emenda judiciária
Para o vice-decano, o inciso LVII do artigo 5º da Constituição “não abre campo a controvérsias semânticas”. Na opinião do ministro, quando autorizou a “execução provisória”, o Supremo editou uma “emenda constitucional ilegítima”. “O abandono do sentido unívoco do texto constitucional gera perplexidades", disse Marco Aurélio.
No dia 1º, o julgamento foi interrompido com o fim da sessão e foi retomado nesta quarta, com os votos dos ministros Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. E ambos mantiveram seus entendimentos de fevereiro, de que aguardar o trânsito em julgado contribui com a morosidade do Judiciário e com a falta de efetividade do sistema penal.
A ministra Rosa Weber, também vencida, concordou com Marco Aurélio. Ela elogiou os colegas que venceram e todos os argumentos, dizendo até concordar com muitos deles. Mas disse que “a interpretação está atrelada às possibilidades semânticas das palavras”.
“Se a Constituição, com clareza, em seu texto vincula o princípio da presunção de inocência a uma condenação transitada em julgado, não vejo como possa chegar-se a uma interpretação diversa.”
Direitos fundamentais
Em fevereiro, ficou vencido o voto do ministro Teori Zavascki, relator do Habeas Corpus em pauta. Segundo ele, a segunda instância encerra a etapa de discussão de fatos e provas de autoria e materialidade. Ao STJ e ao Supremo cabem discussões de direitos e garantias e os recursos a eles não têm efeito suspensivo.
Por isso, a execução da pena antes de pronunciamento das cortes de Brasília não violaria o princípio da presunção de inocência. O ministro Luiz Fux, depois, completou. Disse que ao discutir os direitos fundamentais do acusado, “estamos esquecendo do direito fundamental da sociedade”.
Meio termo
O único que mudou seu posicionamento em relação a fevereiro foi Dias Toffoli. No Habeas Corpus, ele havia acompanhado o ministro Teori. Nesta quarta, atendeu ao pedido intermediário dos signatários da ação de autoria do PEN, para que as penas só possam ser executadas depois de decisão do STJ.
No entendimento de Toffoli, os recursos ao Supremo e ao STJ têm natureza diferente. No primeiro caso, explicou, a instância é extraordinária e pressupõe a presença de questão constitucional em debate e que o processo trata de tema de repercussão geral política, jurídica, social, cultural ou econômica maior que os interesses das partes em litígio. Essas são condições de admissibilidade dos recursos extraordinários pelo STF.
Portanto, concluiu o ministro, assim que é admitido, o recurso ao Supremo deixa de ser subjetivo e passa a discutir questões constitucionais e teses em abstrato.
Já o STJ discute questões subjetivas, que podem influenciar apenas na situação do réu, disse Toffoli. Isso porque a função do tribunal é, além de uniformizar a interpretação da lei, também uniformizar sua aplicação em casos concretos.
Por isso, o recurso especial, cabível ao STJ, “também se presta a corrigir ilegalidades de cunho individual”. “Nem se argumente que aguardar o julgamento do recurso especial custaria a efetividade do processo penal, uma vez que essa efetividade não pode custar direitos fundamentais”, concluiu Toffoli.
Remédio
O ministro Gilmar Mendes também acompanhou a divergência, para dizer que o réu pode ser preso independentemente do trânsito em julgado. Segundo o ministro, em geral, os casos de erros da segunda instância ou decisões teratológicas não chegam ao Supremo por meio de recurso.
De acordo com Gilmar, é o Ministério Público que apresenta os recursos especial e extraordinários, já que não tem outro jeito de chegar ao STJ e ao Supremo. Para os réus, disse, “sempre haverá o Habeas Corpus”.
Foi interrompido pelo ministro Marco Aurélio, que disse que, no que depender da 1ª Turma, nem sempre o réu terá o HC. É que o colegiado tem o entendimento de que o Habeas Corpus não pode ser usado para saltar instância e nem deve ser conhecido se não tratar de violações diretas a liberdade.
A 2ª Turma, da qual Gilmar faz parte, nunca adotou esse entendimento, inaugurado pelo próprio ministro Marco Aurélio. Para Gilmar Mendes, embora o princípio da presunção de inocência seja “relevantíssimo”, pode ser relativizado.
“Por isso, não há de se considerar a prisão de segundo grau haja de ser violadora da presunção de inocência”, concluiu. “Evidentemente poderá haver sim situações de abuso, que reparamos com o HC, nem discutimos isso.”
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