Editorial - Estadão
O PMDB, todo mundo sabe, não é exatamente um partido político orgânico, com uma linha programática claramente definida, mas uma federação de interesses políticos frequentemente conflitantes que só se unem para a conquista ou a manutenção do poder. Pois agora o PMDB é o poder, ele próprio. Deixou de ser coadjuvante. Mas continua sendo a tal federação, na qual cada um fala por si mesmo, e isso não tem ajudado o presidente da República, o peemedebista Michel Temer, a perseguir com tranquilidade e segurança o objetivo de tirar o País da crise a que o lulopetismo o relegou. Agora mais do que nunca poderosos, os ministros de Estado – talvez invejosos da relativa autonomia que por razões óbvias foi conferida à área econômica conduzida pelo ministro Henrique Meirelles – têm-se deixado levar, no mínimo, pela tentação de virar notícia e acabam produzindo nada além de um enorme ruído de comunicação que tem colocado Michel Temer em frequentes saias-justas e disseminado a impressão de que seu governo é uma nau sem rumo. A semana passada foi pródiga em maus exemplos dessa polifonia verbal. Com Temer em Nova York para a Assembleia-Geral da ONU, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, sentiu-se à vontade para discorrer sobre sua convicção de que caixa 2 não é crime e por essa razão quem o pratica não pode ser punido. Foi repreendido a distância pelo chefe, que considerou aquela manifestação “surpreendente” e produto de opinião “personalíssima” do ministro.
O grave na manifestação de Vieira Lima não é apenas o fato de tê-la feito à revelia do presidente, mas a evidência de que representa fielmente a opinião da maior parte da federação peemedebista. Aliás, é exatamente por saber disso que o ministro se sentiu à vontade para manifestar essa opinião e reiterá-la, com ironia e jogo de palavras, na réplica ao puxão de orelhas que sofreu: “Se o Ministério Público manda para a Câmara uma proposta de criminalização de caixa 2, vai se criminalizar o que já é crime? Ou não é crime e precisa se criminalizar? Se não é crime e precisa criminalizar, quem fez no passado não cometeu crime. Se já é crime e vai se punir quem fez no passado, não precisa criminalizar”. Poderia ter dito apenas que caixa 2 é “uma bobagem”.
Os aliados também se sentem no direito de colocar as manguinhas de fora. Dois outros ministros, o petebista Ricardo Barros, da Saúde, e o pepista Ronaldo Nogueira, do Trabalho, botaram mais cravos na coroa de espinhos de Michel Temer. Barros, campeão de bolas fora, aumentou o repertório com a declaração de que não tem certeza de que a PEC do teto para os gastos públicos – proposta considerada vital pelo governo – será aprovada no Congresso. Com ministro assim, para que a oposição?
Por sua vez, Ronaldo Nogueira, homem do PP que comanda o Ministério do Trabalho, declarou acreditar que a reforma trabalhista – outro item prioritário – será adiada para o segundo semestre de 2017. O presidente em exercício, Rodrigo Maia, reagiu imediatamente: “Às vezes, é melhor falar pouco e produzir mais”.
É claro que os maus exemplos de autossuficiência dados pelos próprios peemedebistas estimulam os aliados que compõem o Ministério a multiplicar esses ruídos de comunicação prejudiciais não apenas à imagem do presidente e sua equipe, mas também ao difícil trabalho político de convencimento que precisa ser realizado no Congresso Nacional.
Temer está aparentemente preocupado com a questão da Comunicação, tanto que cogitou contar com a assessoria de um grupo de especialistas no assunto. Mas fê-lo desajeitadamente, com grande publicidade promovida por um de seus autointitulados assessores íntimos. A conversa terminou com a recusa pública de um suposto candidato ao posto de porta-voz, mostrando todo esse episódio que a inabilidade política daquela turma só é superada pela vontade de aparecer.
Resta de positivo, ainda, a autoridade presidencial. Temer, político talvez disposto demais à conciliação, tem dito que prefere sempre ouvir antes de decidir. Isso é bom. Mas a unidade do governo em torno de suas decisões precisa ser preservada acima da diversidade de opiniões e interesses que abriga. Não cabe no Ministério, portanto, quem acha que pode usar o cargo que ocupada para defender opiniões “personalíssimas”.
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